Fenômeno é causado por influência atmosférica. Desde 1977, foi registrado mais duas vezes no Estado, no Pântano do Sul em Florianópolis e em Araranguá
No ano de 2020 Santa Catarina tem enfrentado fenômenos naturais que não costumávamos ter registro, ou que realmente não faziam parte do nosso passado recente. Tornado, uma pandemia global e agora a confirmação de um tsunami que atingiu o Estado em 2019.
Em parte, a ampliação do monitoramento é responsável pelo aumento desses registros.
O tsunami que atingiu Santa Catarina em quatro municípios tem algumas particularidades. Ele é do tipo meteotsunami, causado por influência atmosférica, e diferente do tsunami “normal” que é ocasionado pelo choque das placas tectônicas. E ainda não há como prevê-lo.
O fenômeno, que ocorreu no dia 29 de outubro de 2019, foi registrado inicialmente em Balneário Rincão. Ele passou por Imbituba e Florianópolis, se dissipando próximo a Balneário Camboriú, cerca de duas horas e meia depois.
As ondas oscilaram entre 75 e 118 cm, e viajaram a uma velocidade média de 84 km/h – chegando a 100 km/h em alguns momentos. Alagamentos repentinos carregaram barcos e carros, trazendo prejuízos para pescadores e moradores da costa.
Através da análise de dados captados pelos mareógrafos espalhados pelo litoral catarinense, vários pesquisadores confirmaram e analisaram o feômeno. O estudo foi produzido pelo oceanógrafo Carlos Eduardo Salles de Araújo, o engenheiro agrônomo Matias Boll, ambos da Epagri/Ciram, e outros pesquisadores, sendo publicado pela editora Springer nesta semana, na revista Natural Hazards.
Analisando também dados de radares meteorológicos, os pesquisadores concluíram que a geração dessa onda se deu devido a um alinhamento de uma rápida mudança de pressão atmosférica com as ondas do mar, que estavam chegando às águas costeiras mais rasas.
Tsunamis meteorológicos
De acordo com Araújo, os meteotsunamis são causados por influência meteorológica, sendo um “tipo” de tsunami. Para que ele ocorra, é necessário que um fenômeno atmosférico, por exemplo uma frente fria ou uma linha de instabilidade, se propague na mesma velocidade de uma onda – o que a “alimenta” e amplifica sua velocidade.
Já os maremotos são causados pelo choque de placas tectônicas. Araújo exemplifica a diferença com um pote de água: se batemos no fundo do pote, a água dentro se movimentará (maremotos). Caso soprarmos a água por cima, também haverá movimento (meteotsunami).
Os meteotsunamis entretanto costumam ter impacto menor e já foram registrados outras vezes em Santa Catarina. Na mesma edição da revista Natural Hazards, um estudo do qual Araújo faz parte junto com o professor Rogério Neder Candella, levantou todas as ocorrências de meteotsunamis das quais se tem conhecimento no Brasil, entre 1977 e 2020.
Três registros em SC
Oito meteotsunamis foram registrados neste período no Brasil. Seis deles ocorreram na região Sul do país, “onde a atmosfera costuma ser mais instável devido à passagem de sistemas de baixa pressão, que geralmente se deslocam do Sul para o Norte, através da costa”.
A praia do Cassino, no município de Rio Grande (RS), sofreu o fenômeno por três vezes (1977, 2014 e 2020). Os outros três registros no Sul foram em Santa Catarina.
No Pântano do Sul, no Sul da Ilha de Santa Catarina, ocorreu um meteotsunami em 2009. Em Araranguá, no Sul do Estado, houve um registro em 2016. E agora, em 2019, no município de Imbituba (que atingiu também outras três cidades).
Na maioria dessas ocorrências foram registradas apenas perdas materiais. Mas em uma delas houve registro de morte. Como o artigo ainda não foi publicado na edição impressa, a reportagem não teve acesso aos detalhes do estudo.
Monitoramento marítimo
Justamente por ter influência atmosférica, com dados que oscilam rapidamente, não há um modelo que preveja a formação dos meteotsunamis, explica Araújo. “Os fenômenos meteorológicos às vezes são rápidos, e previstos com pouco tempo de antecedência”, diz.
A ocorrência desses fenômenos hoje é mais conhecida em Santa Catarina devido à facilidade de divulgação e à expansão do monitoramento ambiental em todo o Estado. De 2002 a 2017, 13 mareógrafos foram instalados e aprimorados pela Epagri/Ciram na costa catarinense.
“Só sabemos o que está acontecendo e, talvez poderemos prever no futuro, se tivermos uma rede de monitoramento”, ressalta o oceanógrafo. Os equipamentos, que registram fluxo e o refluxo das marés, produzem amostragens de dados, com informações de certos pontos da costa.
Nos primeiros anos de funcionamento os equipamentos produziam amostragens de 15 em 15 minutos. Hoje produzem amostragem a cada cinco minutos. Um dos aparelhos, em Imbituba, produz amostragem a cada minuto. Ele foi fundamental para a identificação do fenômeno.
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