Mais de 350 jovens, vereadores, secretários municipais, agricultores, pesquisadores e especialistas de renome no Estado debateram as perspectivas sobre o desenvolvimento da região e a sustentabilidade
Despertar na população a preocupação com a preservação do meio ambiente e discutir políticas públicas em favor de um desenvolvimento econômico que priorize a natureza foram alguns dos objetivos do Seminário Meio Ambiente e Sociedade 2019, promovido pela Comissão de Turismo e Meio Ambiente e Escola do Legislativo Deputado Lício Mauro da Silveira, realizado nesta sexta-feira (28), no Centro dos Idosos, em Anchieta. Mais de 350 jovens, vereadores, secretários municipais, agricultores, pesquisadores e especialistas de renome no Estado debateram as perspectivas sobre o desenvolvimento da região e a sustentabilidade.
Além das palestras, também foram apresentados projetos
voltados à preservação ambiental na região, desenvolvidos por prefeituras e por
organizações da sociedade civil. A atividade é a segunda de uma série de sete
eventos voltados ao tema, em todas as regiões do Estado. A primeira foi
realizada em Florianópolis, em junho. Antes do evento, alunos do terceiro,
quarto e quinto anos do Centro Municipal Educacional Infantil e Fundamental
apresentaram uma “mística” sobre os quatro elementos do meio ambiente e sua
preservação.
O deputado Padre Pedro Baldissera (PT), proponente do
encontro, destacou que o objetivo dos seminários é despertar na juventude ações
concretas na relação do meio ambiente e a tecnologia, procurando uma convivência
saudável e prática. Lembrou que, desde 2002, vem trabalhando na conscientização
sobre a preocupação da produção agrícola saudável e a indústria do agrotóxico,
que vem aumentando gradativamente no Brasil.
A realização do seminário em Anchieta, um município
essencialmente agrícola, busca também mostrar a preocupação com o crescimento
de casos de câncer na região e a utilização de agrotóxicos. “Estamos nos
alimentando de veneno e temos que buscar um modelo de desenvolvimento
científico com a produção ecológica e orgânica. Uma produção harmoniosa que se
respeite o meio ambiente e o ser humano.”
O deputado Fabiano da Luz (PT) enalteceu o trabalho
desenvolvido por Padre Pedro Baldissera na preocupação com o meio ambiente.
“Ele é um grande defensor da terra, da natureza e da vida. Desde quando
prefeito de Pinhalzinho, venho acompanhando o trabalho do Padre Pedro na defesa
do meio ambiente.” Fabiano também alertou sobre a preocupação dos deputados
contra a intenção de uma empresa internacional em explorar o xisto em Santa
Catarina, que vai ser discutido na Assembleia Legislativa. “O lobby em favor desta
exploração econômica é grande, mas temos que alertar sobre a situação
ambiental, que poderá ser afetada caso essa exploração seja permitida.”
O prefeito de Anchieta, Ivan Cansi (PT), avaliou como
importante a realização do seminário no município, trazendo um tema que reflete
a realidade econômica e social da região, discutindo o que a população quer
para o futuro por meio de uma reflexão sobre as políticas públicas envolvendo o
meio ambiente e uma vida saudável. “Queremos o desenvolvimento, mas sem degradar
o meio ambiente.”
Cansi citou que Anchieta já teve mais de 11 mil habitantes
na década de 70, mas devido ao êxodo rural, atualmente tem 5.600 habitantes,
por isso debater o meio ambiente e o desenvolvimento econômico tem que ser em
cima de políticas públicas que unam essas duas áreas e planejando o futuro da
região, por meio da conscientização dos jovens.
Aquífero Serra Geral
O professor Luciano Augusto Henning, do Projeto Rede
Guarani/Serra Geral, apresentou a primeira palestra, abordando o tema Ciclo da
Água, Aquíferos, Energia e Gás de Xisto, considerado fundamental para Santa
Catarina, por já existir na pauta projetos para exploração de gás de xisto
utilizando o fracking, tecnologia invasiva que já causou danos ambientais
irreversíveis em diversas regiões do mundo. Henning apontou a importância do
aquífero Serra Geral, mais importante que o Guarani para o estado, por cobrir
51% de Santa Catarina. “Essa água, limpa e boa, está no subsolo catarinense,
nas fraturas das pedras de ferro, e tem que ser preservada e utilizada
conscientemente, apesar de já existir indícios de poluição.”
Henning tem mestrado e doutorado pela UFSC na área de
Geografia e participou de pesquisas na Queen´s University, no Department of
Global Development Studies, em Kingston, no Canadá. Atualmente, além de
pesquisador do projeto Rede Guarni/Serra Geral, integra a equipe de
investigadores do Laboratório de Análise Ambiental (LAAm) do Departamento de
Geociências da UFSC, com ênfase na área de recursos hídricos. Ele explicou que
as águas do aquífero Guarani estão a mais de 1.500 metros de profundidade e que
as águas do Serra Geral são mais acessíveis, por isso a divulgação da sua
existência e a preocupação ambiental com ela é importante. “Primeiro temos que
conhecer, para depois preservar e utilizar conscientemente.”
Contrato com a natureza
A segunda palestra, Energia e Desastres Ambientais,
ministrada pelo professor Marcos Aurélio Espíndola, evidenciou a relação entre
o modelo de geração de energia no país e as consequências ambientais e sociais
para as populações. Para o professor, que é mestre em Geografia pela USP,
doutor em Geografia Humana pela UFSC e Pós-doutor pelo Programa de
Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas, Área de Concentração
Sociedade e Meio Ambiente (Desastres Ambientais e Políticas Públicas), também
pela UFSC, a ideia é conscientizar a população da importância de estabelecer um
contrato com a natureza, estabelecendo uma reflexão em detrimento com o
contrato que herdamos com o iluminismo, que prioriza o social e o econômico.
“Temos que colocar a natureza em evidência, despertar essa
consciência ecológica.” De acordo com o professor, o contrato natural reza que
as relações socioeconômicas entre os homens não podem mais ser regidas pela
premissa de que a natureza é apenas o ponto de partida do processo de produção.
“Somos parte da teia da biosfera e dependemos imediatamente dela para viver. A
natureza é o ponto de partida e de chegada de si mesma.” Espíndola afirma que
não se pode fazer morrer o que faz nascer, apenas para que adquira a forma de
mercadoria, de lucro e de lixo.
Energias renováveis e tecnologias sociais
Com o foco em desenvolvimento de formas alternativas de
geração de energia e sua interação com a sociedade, o professor Marcio Antônio
Nogueira Andrade ministrou o tema Energias Renováveis e Tecnologias Sociais. O
professor, que é mestre e doutor em Engenharia Civil na área de Hidráulica e
Saneamento pela Escola de Engenharia de São Carlos, da USP, e pós-doutor no
Laboratório Nacional de Engenharia Civil – LNEC (Núcleo de Engenharia Sanitária
do Departamento de Hidráulica) em Lisboa, Portugal, e na Cornell University
(Department of Biological and Environmental Engineering) em Ithaca, Nova Iorque
(EUA), defendeu investimentos em tecnologias sociais para que a população possa
sobreviver às adversidades.
Para ele, a tecnologia sustentável pode diminuir os
problemas de convivência harmoniosa com os recursos naturais. Citou como
exemplos a utilização das águas da chuva como recurso hídrico, a utilização da
biomassa residual, como dejetos de animais, para produção de biogás como fonte
de energia. Relatou que na Alemanha, um terço do que é produzido em energia
elétrica na usina de Itaipu é produzida por essa biomassa residual. “Nós somos
um país tropical, a era do carvão e do petróleo está no fim. Nós temos que
utilizar a tecnologia sustentável, disponível no nosso país, como a biomassa, a
energia solar, eólica, para progredirmos.”
Experiências regionais
No período da tarde, o seminário abriu espaço para
apresentações de projetos voltados ao meio ambiente e à sustentabilidade na
região do Extremo Oeste. O prefeito de Anchieta, Ivan Cansi, que é engenheiro
agrônomo da Epagri, abordou o tema modelo de desenvolvimento e o meio ambiente
em Anchieta e região. Ele enfatizou que não existe pensar em desenvolvimento regional
sem pensar no meio ambiente, “tudo está ligado”.
Cansi lembrou que na região, de 1940 a 1970, a população não
respeitava o meio ambiente, a cultura era de limpar os terrenos, queimar
florestas, tirar as pedras para preparar os terrenos. Roçadas e queimadas eram
normais, quando a terra ficava fraca, os agricultores mudavam para outras
áreas. Cultivava-se milho, fumo. De 1980 a 2000, observou que foi o apogeu do
agrotóxico e o início das estiagens na região. “Se intensificou a monocultura
da soja, do milho hídrico. Se introduziu a bovinocultura de leite, que causa a
compactação do solo. Visível degradação do solo e da água.”, disse o prefeito,
que ainda completou: “De 2000 para agora, surgiram os transgênicos, milho
é para silagem, solo descoberto, produção da aveia, e a bovinocultura continua.
Há a retomada do cultivo da subsistência, o ‘fim do desmatamento’ e a escassez
da água”. Como positivo, o prefeito enumerou que a região começou a
investir em cisternas, recuperar a mata ciliar, além da existência de uma
legislação ambiental mais rígida, uma educação ambiental mais presente.
O vice-prefeito de Anchieta, Vilmar Piovesani (PT), falou do
projeto Prefeitura Ecológica, como recolhimento de lixo e práticas sustentáveis
de separação do lixo, coleta de lixo orgânico e transformar esse material em
material de adubação. O agrônomo da Epagri, Jacir Strapasson, abordou o tema
Água para os Bisnetos, de Anchieta, voltado à gestão hídrica e à preservação e
qualidade da água do município e da região. A coordenadora do Grupo Raízes
Ecológicas, Roselei Willi, focalizou o Projeto Agroecologia, abordando a
experiência da produção de alimentos orgânicos, que buscam certificados.
Encerrando o evento, o diretor de Meio Ambiente e Defesa
Civil de Palma Sola, Douglas Fernando Ribeiro, enalteceu o projeto de
tratamento de dejetos humanos, adotado no município desde 2010 e que é
considerado referência nacional para tratamento de esgoto para cidades de
pequeno porte, atendendo todo perímetro urbano de Palma Sola. O projeto está
sendo ampliado e está em fase de conclusão de parceria técnica com outros
municípios da região e pesquisado por outros estados.
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