Home Gestor e profissionais comentam decisão do MEC em suspender criação de novos cursos de medicina

Gestor e profissionais comentam decisão do MEC em suspender criação de novos cursos de medicina

Medida do Ministério da Educação suspendeu a criação de novos cursos de medicina e novas vagas para os cursos existente pelo prazo de cinco anos. Cursos em andamento não serão afetados com a medida.Para debater o assunto a reportagem do Jornal Gazeta ouviu o presidente Simesc Extremo Oeste, Romar Pagliarin, a delegada do CRM, Celina Poletto, e com o presidente do Colegiado de Saúde da Ameosc, Fernando Will

Última atualização: 2018/04/27 9:03:18

O Ministério da Educação suspendeu a publicação de novos editais para criação de cursos de medicina durante cinco anos e o pedido de aumento de vagas em cursos já existentes. A portaria que determina a suspensão, não afetará editais em andamento, universidades federais pactuadas com a Secretaria de Educação Superior (Sesu) do MEC, e cursos já existentes. Foi assinada pelo ministro Mendonça Filho no dia 5 de abril, durante uma reunião com o presidente da República, Michel Temer, no Palácio do Planalto, em Brasília.

A medida, segundo o ministro, visa à sustentabilidade da política de formação médica no Brasil, preservando a qualidade do ensino. “Temos a visão de que a formação médica tem que zelar pela qualidade”, destacou. “Isso é fundamental, tendo em vista, inclusive, a tradição da boa formação médica que o Brasil conquistou nos últimos anos e que precisa ser preservada. Nós teremos uma parada e, respeitando aquilo que vai ser planejado e deliberado por um grupo de trabalho, enxergaremos um horizonte para que a formação médica no Brasil passe por uma avaliação completa e uma adequação, tendo em vista a necessidade da população brasileira de um lado e o zelo pela formação médica do outro.”

Para a decisão, o MEC levou em conta os dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), do Ministério da Saúde e do monitoramento 2016-2019 do Plano Plurianual (PPA) do Governo Federal, que indicam que o Brasil atingiu a meta estipulada de criação de 11 mil vagas/alunos em cursos de graduação em medicina por ano. “Nós mais do que dobramos o número total de faculdades de medicina nos últimos anos, o que significa dizer que há uma presença em termos de formação médica em todas as regiões do Brasil, inclusive nas que tinham uma menor taxa de atendimento.”

A portaria também institui um grupo de trabalho para reorientar a formação médica. Durante o período de suspensão, o MEC promete um amplo e profundo estudo sobre a formação médica no Brasil, que contará com a cooperação do Conselho Federal de Medicina (CFM) e de associações médicas nacionais. De acordo com o MEC, de 2003 a 2018, foram criados mais de 178 novos cursos de medicina no país. Com a estreia do programa Mais Médicos, em 2013, houve um crescimento de escolas médicas e de novas vagas para cursos de medicina. De 2013 a 2017, o número de vagas saltou de 19 mil para 31 mil em todo o país, sendo 12 mil vagas a mais, por ano. No mesmo período, foram selecionados 67 municípios para oferta de cursos de graduação em medicina. 

Gestor não concorda com medida

O secretário de Saúde de São José do Cedro e presidente do Colegiado de Saúde da Associação de Municípios do Extremo Oeste (Ameosc), Fernando Will, não concorda com a medida do MEC. “Penso que podem ser instituídos outros instrumentos de controle da qualidade dos cursos, com apoio do Conselho Federal de Medicina, a exemplo do que já é feito com outros cursos de graduação.

Para o gestor, a expansão do ensino superior na área de medicina possibilitou que os lugares mais distantes, que sempre sofreram com as dificuldades de contratação de profissionais, passassem a contar com novos médicos. “Na nossa região, por exemplo, a falta de médicos para atuar foi minimizada, levando em consideração a oferta de cursos em cidades mais próximas, como: Chapecó, Joaçaba, Cascavel, entre outras. A procura de médicos por novas oportunidades de trabalho no interior cresceu e possibilitou um maior acesso da população ao atendimento na área de medicina, não somente na área pública, mas também na privada, inclusive com mais especialidades”, argumenta.

Conforme Will, na Gestão Pública de saúde, são inúmeros os problemas encontrados pelos gestores para a contratação de médicos. “Além dos vencimentos, que em todas as cidades tiveram um crescimento bastante elevado, devido ao fato de não serem atrativos, o preenchimento de vagas obrigatoriamente precisa ser precedido de testes seletivos e concursos públicos, porque não existe justificativa de contratação emergencial por um longo período. Isso aconteceu muito em nossa cidade (São José do Cedro), sendo que hoje, contamos com uma equipe de 5 médicos, todos efetivos em Estratégia de Saúde da Família. A procura de profissionais ainda é recorrente, tanto por gestores, quanto por profissionais recém formados, que nos procuram todos os dias. Essa é uma realidade do momento, no passado a dificuldade foi maior”, conclui.

Sobre os cursos de medicina já existentes, o gestor acredita que os profissionais estão sendo bem capacitados. “Acredito que sim. Entendo que a essência, o preparo e a capacidade profissional, cada um constrói, e o Ministério da Educação, assim como o Conselho Federal de Medicina, são órgãos fundamentais de controle e que podem contribuir, instituindo novos mecanismos de avaliação da qualidade dos cursos e dos profissionais que estão entrando no mercado de trabalho. Na medicina, esse controle precisa ser ainda maior, uma vez que o profissional está lidando com seres humanos, que buscam atendimento”, conclui.

Delegada do CRM defende decisão

A delegada do Conselho Regional de Medicina (CRM), Celina Poletto, concorda dom a medida do MEC. “Penso que é uma decisão acertada e coerente com o nível de ensino médico desejado. Em primeiro lugar e de fundamental importância é a avaliação da qualidade dos cursos de medicina do país inteiro”, comenta. “A medicina lida com o que temos de mais valioso que é a nossa vida a nossa saúde. Nenhum outro bem material pode superar esse fato. Tendo isso em mente devemos considerar que a qualificação dos médicos é de fundamental importância, muito mais que a quantidade de médicos”, complementa. 

Para Celina, foram abertas inúmeras novas escolas em pequenas cidades do interior, que contam apenas com pequenos hospitais primários e secundários. “A formação médica é extensa e exige uma estrutura física (hospitais, laboratórios, equipamentos) e humana (professores qualificados e especialistas em diferentes áreas) muito grande, que sabidamente não existe em boa parte das escolas de medicina do Brasil. Além disso, existem os interesses financeiros, de grupos de ensino médico que fazem uma pressão muito grande para abertura de novas escolas com mensalidades astronômicas, que são negócios muito rentáveis”, argumenta. 

Para a delegada do CRM, o argumento que muitos defendem de que “quanto mais médicos, melhor será o acesso da população ao atendimento” não procede. “Sabemos que isso não verdade. O argumento de quanto mais médicos melhor é um argumento muito utilizado especialmente em períodos de campanha eleitoral, pois a saúde é um tópico muito sensível e que toca a população, porém o atendimento à população depende de uma série de políticas públicas e especialmente de uma grande contrapartida do governo que não é cumprida”, aponta.

De acordo com Celina, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda o número de um médico para cada grupo de 1000 habitantes, sendo que no Brasil, segundo dados de 2017, há um médico para cada 470 habitantes. “Mais que o dobro do recomendado. É claro que existem áreas do País em que o acesso da população é mais difícil, porém esse é um fenômeno que ocorre em todos os países do mundo”, argumenta, ao citar o Estados Unidos. “A remuneração de um médico na Dakota do Sul e quase quatro vezes maior que a de um médico na Califórnia, mesmo assim ainda faltam médicos na Dakota do Sul”, exemplifica. “Os médicos, como todas as pessoas, procuram localidades para trabalhar em que encontrem condições mínimas para desempenhar sua atividade”, complementa.

A delegada do CRM acredita que muitos dos cursos de medicina precisam melhorar suas estruturas. “Vejo que seria necessária uma reestruturação extensa dos cursos e também que as escolas de medicina devam estar em grandes centros médicos, onde existam profissionais das mais diversas áreas da medicina, equipamentos e pesquisas, pois o conhecimento médico dobra em curto espaço de tempo, e os formadores (professores, universidades) devem estar sempre na vanguarda da medicina”, conclui.

Presidente do Simesc concorda

 

Para o presidente do presidente Simesc Extremo Oeste, Romar Virgílio Pagliarin Junior, a medida foi acertada. “A medida veio ao encontro a uma antiga reinvindicação da classe. Não no sentido de puramente reduzir o número de médicos formados, mas sim no sentido de se ter uma política adequada na formação, estruturação e planejamento do ensino médico voltado para as necessidades do País”, comenta. Para Pagliarin, é comprovado que não é aumento de médicos que vai definir o melhor acesso da população à saúde. “Haja visto o crescimento exponencial de escolas médicas e a situação paralela caótica da saúde pública no Brasil. O que vai melhorar o acesso da população a saúde é uma política de saúde para o Brasil; sustentável, eficaz e moderna”, complementa.

O presidente do Simesc acrescenta que existe número aproximado de 500 mil médicos no Brasil. “Comparado com o número de habitantes chegamos a uma conclusão que o que falta é distribuir melhor os médicos além das fronteiras dos grandes centros. Para isso será necessária uma política adequada de descentralização da medicina, investimento humano e material nas cidades do interior, criar novos postos de trabalho com condições de boa prática médica e reformular o ensino médico, agregando mais qualidade e adequação a saúde no Brasil”, conclui.


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