Em 2014, Bernardo Boldrini foi encontrado enterrado em uma cova rasa, envolto em um saco plástico, em Frederico Westphalen. O pai e a madrasta do menino estão entre os acusados de terem cometido o crime
Após quase cinco anos da morte de Bernardo Boldrini, o caso
está se encaminhando para um desfecho. O julgamento, que indicará se os quatro
réus são inocentes ou culpados, começa na manhã desta segunda-feira (11) em
Três Passos, no Noroeste do Rio Grande do Sul. Entres os acusados, estão o pai
e a madrasta do menino, Leandro Boldrini e Graciele Ugulini. Respondem também
pelo crime os irmãos Edelvânia e Evandro Wirganovicz.
O julgamento será conduzido pela juíza Sucilene Engler, a
partir das 9h30. O G1 RS fará a transmissão ao vivo. A previsão é de que o júri
dure uma semana.
Leandro, Graciele, Edelvânia e Evandro respondem por
homicídio qualificado e ocultação de cadáver. O pai de Bernardo ainda responde
por falsidade ideológica.
Por se tratar de um crime doloso, os réus serão julgados
pelo Tribunal do Júri. Foram sorteados 25 jurados, mais suplentes, todos
moradores da Comarca de Três Passos – que abrange também os municípios de Bom
Progresso, Tiradentes do Sul e Esperança do Sul. Na manhã desta segunda, haverá
um sorteio para selecionar apenas sete para compor o Conselho de Sentença.
O grupo deverá manter-se incomunicável. Eles só poderão
falar com os 15 oficiais de Justiça, que acompanharão os jurados e testemunhas
por tempo integral. Eles também não poderão ter acesso a aparelho telefônico,
internet, televisão, rádio ou jornal. A desobediência à medida acarreta multa
de um a 10 salários mínimos e exclusão da lista geral de jurados.
O processo que apura a morte de Bernardo tem cerca de 9 mil
páginas, distribuídas em 44 volumes. Na fase de instrução processual, foram
ouvidas 25 testemunhas arroladas pela acusação, 29 indicadas pelas defesas e os
quatro réus.
Rito do julgamento
Ao todo, 18 testemunhas prestarão depoimento, sendo cinco
ligadas pela acusação, nove pela defesa de Leandro Boldrini e quatro pela
defesa de Graciele Ugulini. Os outros réus não indicaram testemunhas. Após o
depoimento deles, haverá o interrogatório dos acusados.
Em seguida, começam os debates. O tempo destinado à acusação
e à defesa será de duas horas e meia para cada, e de duas horas para a réplica
e mais duas para a tréplica.
Na acusação, atuará o promotor de Justiça Bruno Bonamente.
Segundo ele, não se tem dúvidas da responsabilização dos quatro
envolvidos”.
“A linha sustentada é a mesma linha que foi proposta na
denúncia. O pai como mandante, a madrasta como articuladora, sempre com o
auxílio do pai, e essa terceira pessoa, a amiga que ela conseguiu em Frederico
junto com o irmão dela, para auxiliar nos atos executórios”, afirma o
promotor.
O coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal da
Segurança Pública do Ministério Público, Luciano Vaccaro, explica que são três
crimes denunciados.
Segundo o Tribunal de Justiça, as qualificadoras
acrescentadas ao homicídio são: motivo torpe, fútil, com emprego de veneno e
mediante dissimulação.
O motivo torpe é devido ao pagamento ou promessa de
recompensa. A madrasta teria oferecido dinheiro (R$ 90 mil, tendo antecipado R$
6 mil) à amiga Edelvânia para que ela a ajudasse a matar o enteado. Outra
questão é que, segundo o MP, Leandro e Graciele não queriam partilhar com
Bernardo os bens da herança deixada pela mãe dele, morta em 2010.
Conforme o TJ, o motivo fútil é pelo fato do casal
considerar o menino um “estorvo no novo núcleo familiar”. E o crime
cometido mediante emprego de veneno é em razão da aplicação de superdosagem do
medicamento Midazolam, apontado como causa da morte de Bernardo. Segundo o MP,
Edelvânia e Graciele teriam adquirido o remédio utilizando receituário azul com
timbre e carimbo de Leandro.
O crime cometido mediante dissimulação, de acordo com o TJ,
seria porque Bernardo foi levado por Graciele até Frederico Westphalen, sem
saber a real intenção da mulher.
“O crime de homicídio qualificado prevê uma pena de 12
a 30 anos, mas tem ainda essas qualificadoras. Esperamos que seja elevada [a
pena] e que confirme a realização da justiça e a punição desses criminosos por
esse crime grave”, acrescenta Vaccaro.
Defesa dos réus
O advogado de Edelvânia Jean Severo informou que a cliente
foi “coagida a fazer a cova e enterrar o menino”.
“O menino caiu morto nos pés dela. Por obra da
madrasta. Essa é a participação da Edelvânia. Coagida. A madrasta ameaçou a
Edelvânia de morte, falou que tinha poder financeiro e que ela não ia suportar
isso, que a única que ia sair presa dessa situação era a Edelvânia. Foi
ameaçada a mãe da Edelvânia, que é a pessoa mais importante da vida dela. E
Edelvânia acabou sucumbindo, erroneamente, é o que nós vamos sustentar em
plenário”, afirma.
O advogado acrescenta que a cliente “tem que ser
condenada na ocultação de cadáver, mas no homicídio é impensável a condenação
dela”.
O outro advogado de Edelvânia Gustavo Nagelstein afirmou
que, diante dos jurados, “ela vai pedir perdão pelo ato que ela cometeu,
que foi omitir, ocultar o cadáver desse menino, que com certeza é um fato
gravíssimo, mas que os jurados também tenham clemência com ela em relação ao
crime de homicídio” que, segundo ele, ela não cometeu.
Os advogados de Leandro, Graciele e Evandro informaram que
não vão se manifestar sobre o assunto.
Esquema especial de segurança
O 7° Batalhão da Polícia Militar informou que receberá apoio
do efetivo do Batalhão de Polícia de Choque de Santa Maria, que realizará o
controle de trânsito e o policiamento ostensivo em torno do fórum de Três
Passos. A BM acrescentou que, durante os dias do julgamento, a calçada em
frente e na lateral do prédio será isolada.
A Brigada acrescentou que será proibida a aglomeração de
pessoas no local. Além disso, não será permitida a colocação de caixas e
veículos de som, para evitar a perturbação dos trabalhos, conforme pedido do
Poder Judiciário.
Relembre fatos do caso
Morador de Três Passos, Bernardo Uglione Boldrini
desapareceu no dia 4 de abril de 2014. Ele foi encontrado morto 10 dias depois,
em uma cova vertical nas margens de um riacho, em Frederico Westphalen. Laudos
periciais atestaram a presença de Midazolam no estômago, rim e fígado do
menino. A superdosagem do medicamento teria sido a causa da morte da criança.
No dia do desaparecimento de Bernardo, Graciele foi multada
por excesso de velocidade na ERS-472, em um trecho entre os municípios de
Tenente Portela e Palmitinho. A mulher trafegava a 117 km/h e seguia em direção
a Frederico Westphalen, que fica a cerca de 80 km de distância de Três Passos.
O Comando Rodoviário da Brigada Militar (CRBM) disse que ela estava acompanhada
de Bernardo.
Segundo a denúncia do Ministério Público, Graciele conduziu
o enteado até Frederico Westphalen. Ao iniciar a viagem, ainda em Três Passos,
ministrou-lhe, via oral, a substância Midazolam, sob o argumento de que era
preciso evitar enjoos. Em seguida, já na cidade vizinha, Graciele encontrou a
amiga Edelvânia Wirganovicz.
Conforme ainda o MP, Graciele, com apoio moral e material de
Edelvânia, aplicou em Bernardo mais uma injeção intravenosa da substância, em
quantidade suficiente para lhe causar a morte.
A denúncia ainda aponta que Evandro Wirganovicz foi o
responsável por fazer a cova vertical, além de limpar o entorno do local, dois
dias antes da morte de Bernardo, para facilitar o crime.
Conforme o MP, em um vídeo, gravado no celular de Leandro,
Graciele ameaça Bernardo, dizendo: “Eu não tenho nada a perder, Bernardo. Tu
não sabe do que eu sou capaz. Eu prefiro apodrecer na cadeia a viver nesta casa
contigo incomodando”.
Bernardo morava com o pai, a madrasta e a filha do casal, à
época com cerca de um ano, em uma casa em Três Passos. A mãe do menino,
Odilaine, foi encontrada morta dentro da clínica do então marido em fevereiro
de 2010. A polícia havia concluído que ela cometeu suicídio com um revólver.
Mas a defesa da mãe dela, Jussara Uglione, contestou a versão. O inquérito foi
reaberto. Concluído em março de 2016, a nova investigação não apontou indícios
de homicídio. Para a polícia, Odilaine se matou.
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