Home O IMBECIL JUVENIL

O IMBECIL JUVENIL

Última atualização: 2018/08/24 9:14:03

Não acredito na mentira que celebra a juventude como uma época de rebeldia, de independência, de amor à liberdade. Nunca dei crédito a esta bobagem, nem mesmo quando jovem, pois na época pouco se falava nisso. Ao contrário, desde cedo me impressionaram, na conduta de meus companheiros de geração, o espírito de rebanho, o temor do isolamento, a subserviência à voz corrente, a ânsia de sentir-se iguais e aceitos pela maioria cínica e autoritária, a disposição de tudo ceder, de tudo prostituir em troca de uma vaguinha no grupo dos bacanas.

O jovem, é verdade, rebela-se muitas vezes contra pais e professores, mas é porque sabe que no fundo estão do seu lado e jamais revidarão suas agressões com força total. A luta contra os pais é um teatrinho no qual um dos contendores luta para vencer e o outro para ajudá-lo a vencer.

Muito diferente é a situação do jovem ante os da sua geração, que não têm as complacências do paternalismo. Longe de protegê-lo, essa massa barulhenta recebe o novato com desprezo e hostilidade que lhe mostram a necessidade de obedecer. É o reino dos mais fortes que se firma sobre a fragilidade do recém-chegado, antes de aceitá-lo como membro. Para não ser devolvido aos braços da mãe, ele tem de ser aprovado num exame que lhe exige a supressão de sua personalidade.

É verdade que ele se submete a isso com prazer, com ânsia de apaixonado que tudo fará em troca de um sorriso condescendente. A massa de companheiros de geração representa o mundo grande no qual o adolescente, emergindo do pequeno mundo doméstico, pede ingresso. E o ingresso custa caro. O candidato deve, desde logo, aprender todo um vocabulário, um código de senhas e símbolos. A  mínima falha expõe ao ridículo, e a regra do jogo é implícita, devendo ser adivinhada antes de conhecida. O modo de aprendizado é sempre a imitação sem questionamentos. O ingresso no mundo juvenil dispara a toda velocidade o motor de todos os desvarios humanos.

Não é de espantar que o rito de ingresso no grupo, custando alto investimento psicológico, termine por levar o jovem à completa exasperação. 

Para onde, então, se voltará o rancor? A família surge como o bode expiatório de todos os fracassos do jovem no seu rito de passagem. 

Eis a que se resume a famosa rebeldia do adolescente: amor ao mais forte que o despreza, desprezo pelo mais fraco que o ama. Este o motivo pelo qual a juventude, desde que a covardia dos adultos lhe deu autoridade para mandar e desmandar, esteve sempre na vanguarda de todos os erros e perversidades do século: nazismo, fascismo, comunismo, seitas pseudorreligiosas, consumo de drogas. São sempre os jovens que estão um passo à frente na direção do pior. Um mundo que confia seu futuro ao discernimento dos jovens é um mundo velho e cansado, que já não tem futuro algum.

GERAÇÃO PERDIDA

Os jovens eleitores do passado, tanto quanto os atuais, percebem que nada sabem do que é bom ou mau para seu país, estado ou município e muito menos das ideologias em disputa nas eleições. Por isso abstém-se de votar e a partir daí começam a estudar o País onde vivem. Ao envelhecer, podem ajudar muitas gerações a votar com mais seriedade e conhecimento de causa, sem deixar-se iludir pelas falsas alternativas da propaganda imediata. Saber primeiro para julgar depois é o dever número um do homem responsável. Dever que o voto obrigatório, sob a escusa de ensinar, força a desaprender. As coisas podem não ser o que parecem. 

Hoje, raramente se encontra um jovem que não queira “transformar o mundo”, e que não transfira aos gregos o dever de perguntar o que é o mundo.

No Brasil, cultura e inteligência são coisas para depois da aposentadoria. Quando todas as decisões estiverem tomadas, quando a massa de seus efeitos tiver se adensado numa torrente irreversível de declínio, aí o cidadão pensará em adquirir conhecimento que, a essa altura, só poderá servir para lhe informar o que deveria ter feito e não fez. Então, o conhecimento perderá toda a sua força, reduzindo-se a um penduricalho, a um adorno inofensivo de uma velhice calhorda. 

Eis onde termina a vida daquele que, na juventude, em vez de esperar até compreender, cedeu à tentação lisonjeira do primeiro convite e se tornou um “participante”, um “transformador do mundo”.

O Brasil é o país do gênio prematuro, degradado em bobalhão senil logo na primeira curva da maturidade. Em todas essas pessoas que falam em nome do futuro, o sentimento dominante é a saudade de si mesmas. Não falta a esses indivíduos a consciência de que suas vidas falharam. Mas atribuem a culpa aos outros, ao governo militar que impediu sua geração de “chegar ao poder”. No entanto, a desculpa é falsa, porque, mal ou bem, eles estão no poder. Eram jovens militantes, hoje são deputados, são catedráticos, são escritores de sucesso, são formadores de opinião. Por que, então, lambem com tanta nostalgia e ressentimento as feridas da sua juventude perdida? É porque foi perdida num sentido muito mais profundo e irremediável que o da mera derrota política. 

A agora é tarde para voltar atrás.


deixe seu comentário

leia também

leia também