Dados foram atualizados pelo Ministério da Justiça. Na semana passada, ação em bloco concedeu refúgio para 21 mil venezuelanos no Brasil
Pela lei, é um refugiado qualquer pessoa que é obrigada a deixar o país em que vive por temor de perseguição motivada por raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, ou por causa de uma grave e generalizada violação de direitos humanos. Sírios fugindo da guerra no país árabe, venezuelanos escapando da crise ou haitianos que deixaram o país após o desastre causado por um terremoto em 2010 são alguns exemplos de refugiados que vieram em peso para o Brasil nos últimos anos.
Os pedidos de refúgio no Brasil são julgados pelo Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), vinculado ao Ministério da Justiça. Em um marco para o tema em nível nacional, na última quinta-feira (5) o Conare julgou um bloco de pedidos e concedeu o status de refugiados para 21,4 mil venezuelanos. Com base na análise de um “cenário de grave e generalizada violação de direitos humanos no território venezuelano”, o órgão julgou de forma unânime o pedido dos refugiados.
O número de autorizações concedidas é alto, mas ainda representa apenas uma fatia de todos os pedidos de refúgio que ainda tramitam no Brasil. Conforme dados do Ministério da Justiça, somente em Santa Catarina quase 6 mil estrangeiros aguardam por uma decisão sobre o pedido de refúgio. O número faz SC ser o quinto Estado do Brasil com mais pedidos de refúgio em análise, atrás de Roraima, São Paulo, Amazonas e Acre. Com exceção de SP, os Estados da região Norte lideram o ranking por causa das fronteiras frequentemente utilizadas.
A lista do ministério foi atualizada em outubro e citava um total de 5934 pedidos de refúgio feitos em Santa Catarina, a maioria (3491) para haitianos. O segundo país com mais pedidos era Cuba, seguido por Venezuela, Gana e Bangladesh.
São pedidos feitos entre 2013 e 2019 e que aguardam a análise do Conare. Enquanto isso, os estrangeiros podem morar no Brasil e têm direitos garantidos, mas ficam em um “limbo” jurídico em alguns pontos, conforme explica a professora da Universidade do Vale do Itajaí (Univali) e mestre em Direito e Relações Internacionais, Arisa Ribas Cardoso.
— O status de refugiado garante direitos como migrantes, com algumas restrições. Ela consegue trabalhar, tem acesso aos serviços públicos de saúde, educação, direito à residência e uma proteção contra a devolução forçada ao país de origem. Pela lei se considera que enquanto há o pedido a pessoa já é refugiada, está pendente só de reconhecimento. Então mesmo sem a decisão, ela já tem os direitos básicos e não pode ser devolvida ao país de origem, mas fica num limbo, não tem documentação definitiva, só provisória, é uma situação transitória precária que pode a qualquer momento ser revogada — explica a professora.
Decisões sobre refúgios andam em ritmo lento
Antes do julgamento do bloco de 21 mil venezuelanos — que ainda não teve as informações estaduais divulgadas pela Polícia Federal e pelo Ministério da Justiça —, em 2019 apenas 21 pedidos de refúgio feitos em Santa Catarina haviam sido julgados pelo Conare. Destes, apenas cinco foram negados. A maioria das autorizações foi para pessoas da Síria e com pedidos em Florianópolis, mas há registro também em Joinville, Chapecó, Itajaí e Lages.
No ano passado os dados do Ministério da Justiça mostram que o volume de pedidos julgados foi muito maior. Somente em SC foram 334 pedidos com análise feita, embora a maioria tenha sido arquivada ou negada — somente 21 foram aprovados.
A professora Arisa Ribas Cardoso explica que, historicamente, os processos de pedidos de refúgio são lentos no Brasil, mas em 2019 o ritmo foi ainda mais devagar por conta das mudanças administrativas no governo federal e uma redução na equipe do Conare. Para ela, Santa Catarina aparece entre os Estados que mais recebem pedidos por uma série de fatores econômicos e sociais:
— O Estado tem um perfil econômico que tem atraído os imigrantes, com empresas acolhendo. Muita gente está indo para o Oeste trabalhar no setor agropecuário, ou nas indústrias no Vale do Itajaí. O próprio governo federal tem as políticas de distribuição para o interior dos imigrantes que cruzam a fronteira, e essa decisão se baseia em necessidade de mão de obra e outros fatores — explica Cardoso.
Diferentemente dos imigrantes que conseguem autorização para fixar residência no Brasil, independentemente da situação que motivou a chegada ao país, os estrangeiros com status de refugiado têm uma permanência temporária no Brasil. As leis que tratam o refúgio citam que o asilo é temporário enquanto a situação de violação dos direitos ou ameaça persistir no país de origem. Num exemplo para os refugiados venezuelanos, por exemplo, o governo brasileiro pode entender em algum momento que a crise no país vizinho se encerrou e, portanto, não há mais razão para o refúgio. Todas as decisões passam pelo colegiado do Conare, além da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR).
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