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Senado aprova restrição às ‘saidinhas’ de presos

Texto do projeto de Lei que tem por objetivo restringir o benefício da saída temporária para presos, volta para a Câmera

Fonte: RCN

Última atualização: 2024/02/21 11:59:36

Projeto de Lei que visa restringir o direito das “saidinhas” concedido a condenados

Nesta terça-feira, dia 20, o Senado aprovou o Projeto de Lei (PL) 2.253/2022, que estabelece restrições ao benefício da saída temporária para presos condenados. Originalmente, o projeto, relatado pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), propunha a revogação completa do benefício. No entanto, foi modificado para permitir as saídas de presos que estão matriculados em cursos educacionais. A proposta efetivamente elimina a prática da liberação temporária de presos em datas festivas e feriados, popularmente conhecida como “saidinha”. O texto, aprovado com 62 votos a favor, dois contra e uma abstenção, será enviado novamente para análise dos deputados.

Apresentado inicialmente pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), o projeto, em sua forma original, revogava partes da Lei de Execução Penal (Lei 7.210, de 1984) relacionadas às saídas temporárias. De acordo com a legislação atual, esse benefício é concedido a condenados que cumprem pena em regime semiaberto, permitindo-lhes sair até cinco vezes por ano, sem vigilância direta, para visitar familiares, estudar fora da prisão ou participar de atividades de ressocialização.

O Senado aprovou o projeto com modificações significativas. Uma das emendas, apresentada pelo senador Sergio Moro (União-PR), reverte a revogação total do benefício. De acordo com o texto aprovado, as saídas temporárias ainda serão permitidas, mas apenas para presos matriculados em cursos profissionalizantes, ensino médio ou superior, e apenas pelo tempo necessário para essas atividades. As outras justificativas atualmente aceitas para as saídas temporárias, como visitas familiares e participação em atividades que contribuam para a reintegração social, deixam de existir na lei.

— O projeto acaba com as saídas temporárias em feriados, o que é diferente da autorização para o preso estudar ou trabalhar fora do presídio quando em regime semiaberto ou em regime aberto. (…) Por ter total pertinência, obviamente, nós resgatamos esse instituto, que, de fato, contribui para a ressocialização dos presos, que é a possibilidade de estudarem, de fazerem um curso profissionalizante — explicou o relator, que considera a solução apresentada por Moro a mais adequada.

A emenda também introduz novas restrições mesmo para os presos autorizados a sair para fins educacionais. Atualmente, os presos condenados por cometer crimes hediondos com resultado de morte não têm direito a esse benefício. O texto revisado estende essa restrição para presos condenados por crimes hediondos ou que envolvam violência ou grave ameaça contra a vítima.

Moro relata: “Então, estamos preservando, sim, aquilo que é realmente relevante para o preso do semiaberto, que é a saída para a educação e para o trabalho. Ainda assim, colocamos uma cláusula de segurança, uma norma de segurança estabelecendo que, mesmo para essas atividades, não tem o direito à saída temporária aquele que foi condenado por crime hediondo e por crime praticado com violência ou com grave ameaça contra a pessoa. Temos que ter salvaguardas para proteger a população, para proteger os outros indivíduos”.

Na discussão, senadores solicitaram ao líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), que interviesse com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para evitar um possível veto ao texto. O líder destacou que o projeto ainda passará pela Câmara novamente e negou que o governo tenha tomado uma posição definitiva sobre um possível veto.

Homenagem ao Sargento Roger Dias da Cunha

Além disso, o texto passou por modificações para incluir a determinação de que, caso seja sancionada, a lei será denominada “Lei PM Sargento Dias”. O qual foi incluído pelo relator em homenagem ao sargento Roger Dias da Cunha, pertencente a Polícia Militar de Minas Gerais. No dia 5 de janeiro, após uma abordagem a dois suspeitos, Roger foi baleado na cabeça, os suspeitos teriam sido responsáveis pelo furto de um veículo em Belo Horizonte. O autor dos disparos era considerado um foragido da Justiça, o qual havia sido beneficiado pela saída temporária e que já deveria ter voltado à penitenciaria em 23 de dezembro.

— Foi liberado e matou um policial, um jovem a serviço da sociedade. Uma sociedade tão estranha que faz um concurso público, seleciona os nossos melhores jovens, coloca numa academia de polícia, dá a eles uma arma e uma carteira e os joga numa selva desprotegida. Nós condenamos os policiais todos os dias, não damos a eles o apoio necessário — afirmou o senador Carlos Viana (Podemos-MG).

Regras do novo projeto

O projeto também trata de outros temas, além da restringência das saídas temporárias. Sendo um destes, a necessidade de exame criminológico para a progressão de regime de condenados. De acordo com o texto, o apenado só terá direito ao beneficio se “ostentar boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento e pelos resultados do exame criminológico”. Um teste deverá avaliar, por exemplo, se o individuo é capaz de se ajustar ao novo regime “com autodisciplina, baixa periculosidade e senso de responsabilidade”.

“A exigência de realização de exame criminológico para progressão de regime é aceita pelos tribunais superiores, desde que fundamentada em decisão. Nesse sentido, a Súmula Vinculante nº 26 do STF [Supremo Tribunal Federal] e a Súmula 439 do STJ [Superior Tribunal de Justiça] respaldam tal prática. Portanto, o condicionamento proposto pelo projeto de lei está em conformidade com a jurisprudência das nossas mais altas instâncias judiciais”, explicou o relator.

O projeto também estabelece diretrizes para a monitoração de presos. Segundo a proposta, o juiz pode ordenar o uso de dispositivos eletrônicos para fiscalizar a aplicação de penas a serem cumpridas nos regimes aberto ou semiaberto, bem como conceder progressão para tais regimes. Outras situações previstas incluem a imposição de penas restritivas de direitos que determinem limitações de acesso a locais específicos e a concessão de livramento condicional.

Além disso, de acordo com o PL 2.253/2022, os presos que violarem ou danificarem os dispositivos de monitoração eletrônica estarão sujeitos a punições, tais como a revogação do livramento condicional e a conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade.

Destaques apontados na avaliação do projeto

O senador Fabiano Contarato (PT-ES), favorável à aprovação do projeto, destacou que a pena serve a dois propósitos: reintegração ao convívio social e familiar, e retribuição pelo crime cometido. Ele mencionou diversos dispositivos legais que reduzem substancialmente a pena dos condenados, como progressão de regime, remissão da pena pelo trabalho, comutação de pena e liberdade condicional. O senador, que é líder do PT, liberou a bancada para votar.

— Não posso deixar de manifestar a minha fala no sentido de que, diante dessas circunstâncias, não é razoável explicar para quem teve seu filho morto por um homicídio doloso, em que o cara foi condenado a nove anos de reclusão, que não vai ficar nem três anos preso. (…)  Por essa razão, eu peço humildemente perdão à minha bancada do Partido dos Trabalhadores e das Trabalhadoras, mas eu não sairia daqui com a minha consciência tranquila votando não contra a saída temporária, por entender que é mais um benefício dado e que vai passar não a sensação, mas a certeza da impunidade — comenta.

Ele, que foi delegado de Polícia, apresentou emendas para estender a proibição de saídas temporárias para todos os condenados que cumprem penas por crimes inafiançáveis. O destaque apontado foi rejeitado pelos senadores, de acordo com a orientação do relator.

Flávio Bolsonaro foi acusado pelo senador Otto Alencar (PSD-BA) de ser contrário ao destaque, com o objetivo de proteger os condenados por crimes cometidos nos ataques antidemocráticos do 8 de janeiro, que, passariam a não ter direito ao benefício caso o projeto seja estabelecido.

— Não tem explicação. Vossa Excelência quer excluir quem atentou contra a democracia no 8 de janeiro, terrorismo, ameaça ao Estado democrático de direito. Vossa Excelência não convenceu, não explicou absolutamente nada — acusou o senador Otto, que ainda citou milicianos.

Flávio Bolsonaro argumentou que discutir o evento de 8 de janeiro não era pertinente à pauta em questão e acusou a base do governo de politizar indevidamente o assunto, lançando ataques políticos aos apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Os senadores também recusaram uma emenda proposta por Contarato que visava permitir o benefício da saída temporária não apenas para os presos matriculados em cursos profissionalizantes, ensino médio e superior, mas também para aqueles envolvidos em programas de educação básica destinados a jovens e adultos. O senador Jorge Kajuru (PSB-GO), vice-presidente da Comissão de Segurança Pública (CSP), destacou a emenda e defendeu sua aprovação.

— Investir na educação dos detentos não apenas os capacita para uma vida melhor após o cumprimento da pena, mas também contribui para a redução de conflitos dentro das instituições prisionais. A educação é uma ferramenta poderosa na promoção da paz e na construção de um ambiente propício ao desenvolvimento pessoal e social — afirmou o senador anteriormente a sua rejeição.

Falta de Estrutura

A senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), mesmo após defender sua posição afirmativa ao texto, criticou a pressa com que o projeto em qustão foi discutido. Ela afirmou que em alguns estados, como Goiás e Minas Gerais, não há estrutura para o cumprimento da pena em regime semiaberto, gerando o embate em que presos saiam diretamente do regime fechado para o aberto. De forma mais  clara, a senadora comenta que é uma “saidona” e que a aprovação do projeto é “enxugar gelo”.

— Aqui ninguém é bobo. Eu vou votar a favor, vou apoiar os destaques, mas em nenhum momento vou passar pano ou fingir para o povo brasileiro. Tudo isso que está acontecendo aqui é para esconder o problema real, então vamos cobrar do Poder Executivo que cumpra o seu dever, invista, construa estruturas para os regimes semiabertos — fala Soraya ao citar governos estaduais.

Rodrigo Cunha (Podemos-AL), também empregou o exemplo analisado e exposto pela senadora, fazendo uma relação ao seu estado, onde há da mesma forma a ausência de uma estrutura para o cumprimento de pena no regime semiaberto.

—  Toda essa revolta está sendo colocada para fora nos casos em que o semiaberto permite a “saidinha”. Imagine num estado que nem semiaberto tem há mais de dez anos! Tem estímulo maior para impunidade do que esse? — questionou o senador Rodrigo.

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