Convidamos você para conhecer um pouco mais sobre a construção histórica de São Miguel do Oeste, sob a contribuição da entrevistada Esla Baldissera, que recebeu nossa reportagem com muitas recordações bonitas do desenvolvimento do município, que completou nesta semana,64 anos de emancipação
Em pouco mais de 40 minutos de conversa, Elsa Cesca Baldissera, de 83 anos, mais de 70 deles vividos em São Miguel do Oeste, recebeu a reportagem do Jornal Gazeta em sua casa e com uma ávida memória, enriquecida de detalhes, resgatou parte do desenvolvimento do município de São Miguel do Oeste, sob sua ótica. O que possibilitou um belo resgate de sua trajetória de vida e também da história de desenvolvimento do município polo do Extremo-oeste, que completou 64 anos de emancipação político administrativa nesta semana, dia 15.
Ainda jovem, com oito anos, ela saiu do Rio Grande do Sul com a família, que inicialmente fixou morada na atual comunidade de linha Famoso, em Descanso. Aproximadamente três anos depois, em 1946, optaram por residir na Vila Oeste, que mais tarde passaria a ser São Miguel do Oeste. “Tinha só umas 20 casinhas na época”, relembra.
Com a mãe falecida logo nos primeiros anos de vida, Elsa foi criada pela irmã Adélia Cesca e pelo cunhado, Waldemar Rangrab. A família trabalhava com madeireira e viu na região uma oportunidade de recomeçar a vida. Contava muito com o apoio do pioneiro e também fundador, Padre Aurélio Canzi, que auxiliava a família financeiramente, sempre que precisavam. “Quando dava enchente, que nós podia mandar a madeira (para comercializar), em agradecimento, meu pai comprava bombacha, batina, e vestia o padre Aurélio”, lembra ao citar a proximidade da família com o Padre.
Em um período em que mulheres tinham dificuldade de conquistar a independência, Elsa quis estudar, algo que custava muito dinheiro à época pois precisava de deslocamento a grandes centros. Incentivado por Padre Aurélio, Waldemar permitiu que a filha fosse estudar, inclusive emprestando recursos para isso. Elsa formou-se técnica em contabilidade e decidiu retornar para São Miguel do Oeste, onde conheceu o esposo Daniel Baldissera, com quem teve quatro filhos.
Ela comenta a reportagem do jornal, ainda com riqueza de detalhes que o encontro do casal ocorreu graças a um batizado, pois foram convidados para serem padrinho e madrinha da criança. Ela relembra que não esperou a data para conhecer Daniel. Foi até o comércio do futuro marido e se apresentou. “O apelido dele era ‘cabeção da esquina’, e ele tinha comércio ali onde hoje tem o Serginho (Lanches). Um dia antes de ir batizar que conheci o Daniel. Entrei na loja e pedi quem era o Daniel. Uma moça que trabalhava lá disse ‘aquele sentado lá no canto’. Fui lá e me apresentei e deu certo (brinca), e em 1957 casamos”, relembra.
“Era pouco, mas o suficiente”
Questionada sobre como era viver naquela época, ela destaca que ela e o esposo tinham um comércio onde se ‘vendia de tudo um pouco’, desde alimentos até roupas e utensílios para a casa e a lavoura. Os mantimentos eram buscados em viagens a São Paulo. Segundo Elsa, a vida era difícil no início, mas as pessoas se satisfaziam com pouco. Ela relembra que na juventude, o divertimento era se reunir em grupos, com gaita e violão, algo simples, mas que garantia o entretenimento da juventude. Comenta ainda que com o desenvolvimento da cidade sua família se envolveu na fundação do Clube Comercial, que também possibilitou festas maiores e trazia artistas de renome nacional na época, como shows dos cantores Vanusa e Agnaldo Rayol, dentre outros, no clube.
Família e a ligação com a política
A vida de Elsa desde o início esteve entrelaçada a política do município. Ela foi criada por Waldemar Rangrab, personagem conhecido da histórica migueloestina, tendo sido vereador e prefeito, e hoje dá nome a uma das principais ruas do município em sua homenagem. Quis o destino que Gilmar, um dos quatro filhos do casamento com Daniel Baldissera, fosse também prefeito, incentivado pelo tio Leolino Baldissera, que também foi vereador e prefeito. Principal incentivador, Leolino pôde ver a vitória de Gilmar Baldissera, o Gica, nas urnas em 1996, mas não o viu assumir a Prefeitura, pois faleceu em novembro daquele ano.
O sonho do hotel e o amor por São Miguel do Oeste
Dentre os diversos episódios históricos apontados ela comenta que o esposo Daniel, possuia comércio e também trabalhou com granja de suínos, mas o grande sonho era ter um hotel. Para realizar, vendou a granja e adquiriu os terrenos necessários, comprou material direto da fábrica e construiu o Hotel Solaris, um projeto visionário na época. Para comprar os terrenos, ouviu proposta do proprietário que morava fora do município, ficou de analisar e ligar às 19h. “Em casa e ansioso o Daniel quis ligar antes, mas eu não deixei, disse pra ele, liga só perto das 19 horas”, relembra. E faltando pouco para o horário, ele ligou e o negócio foi concretizado.
Elsa recorda que o marido questionou ao proprietário o porquê dele ter fechado o negócio, pois tinha o conhecimento de propostas anteriores de outros empresários que não foram aceitas. “Meu marido perguntou porque ele aceitou. E ele disse ‘porque o único pontual foi você’. Ele prezava muito pela pontualidade, pela palavra”, relembra.
O hotel começou a ser construído em 1989, com um projeto para o futuro do município. “Meu marido não pensava para agora, pensava sempre para frente. E ele sempre dizia que o dinheiro que ele tinha ganho aqui, ele ia empregar em São Miguel do Oeste. E foi o que fez. A única coisa que nós temos fora é um apartamento que a Jaque (Filha) mora em Porto Alegre. O resto foi tudo plantado aqui. Isso nos orgulha, a gente foi fiel. Meu cunhado também investiu, os filhos assumiram e investiram. A gente tem orgulho da família. Porque teve famílias na época que começamos, que eram mais abastadas que nós e hoje não têm mais nada”, comenta emocionada.
Sobre o futuro do município, Elsa reforça que hoje, São Miguel do Oeste possui boas condições para quem mora nele, mas que a atenção para ‘deixar a cidade cada vez mais bonita’, é fundamental, e que isso, consequentemente irá atrair mais pessoas para morar nela bem como melhorarar qualidade de vida dos que aqui já vivem.
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